— um dos estopins de certa diáspora — no qual apresenta credenciais que o tiram do incômodo (pra alguns...) ANONIMATO SEM CACHORRO e ilustram o coloradismo de sua família. Quase ao final, permite-se revelar um sonho "frustrado".
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GENEALOGIA COLORADA
Tudo começa com meu bisavô, sócio efetivo número
586 do S. C. Internacional.
Caderneta de sócio nº 586 |
E continua com meu avô, sócio efetivo número 927 do S. C. Internacional.
Caderneta de sócio nº 927 |
Meu avô foi arqueiro do Internacional. Participou do
memorável grenal de número 55, mais conhecido como “grenal dos 11 a zero” (o resultado oficial foi Inter 6 x 0 Grêmio), ocorrido em
1º de Novembro de 1938. Lembro-me dele contando (mais de uma vez) que o árbitro
(Álvaro Silveira) anulou cinco gols legítimos do Internacional, e, depois do
jogo, quando inquirido sobre o fato, declarou que o fez, pois achava que
"era gol demais para um só grenal". Meu avô participou, também, da
formação inicial do Rolo Compressor. Aparece na foto abaixo, ao lado de
Tesourinha, Carlitos entre outros.
Formação inicial do Rolo Compressor |
Mas ele teve um problema de doença na família (a
esposa dele teve uma grave doença — isso ocorreu quando ele tinha cerca de 20
anos, imaginem a pancada), o tratamento era muito caro e os remédios precisavam
ser importados dos Estados Unidos. Foi falar com os dirigentes do Inter, mas
disseram que tudo o que o Inter poderia fazer seria permitir a venda dele, caso
surgissem propostas. Um dirigente se dispôs a pagar o tratamento do próprio
bolso, mas meu avô não aceitou. O Grêmio comprou seu passe e ele usou o dinheiro
da venda no tratamento da doença. A permissão da venda dele para o Grêmio foi
uma concessão feita pelos dirigentes do Inter, pois esse tipo de transação
nunca foi comum. Infelizmente o tratamento não surtiu resultado e ela veio a
falecer. Eu não conheço detalhes dessa época, mas dizem que ele viveu um par de
anos como um morto-vivo. Meu avô, com as forças que tinha, jogou no Grêmio nos
anos derradeiros do Rolo. Certamente, pelo HOMEM que foi, deu o seu melhor.
Time do Grêmio que interrompeu a sequência de vitórias do Rolo em 1946 |
Para mim nunca admitiu torcer por nenhum time. Era
"grenalista", mas minha avó confidenciava que ele torcia pelo Grêmio.
Foi o primeiro jogador gaúcho a ganhar o Belfort Duarte. Após encerrar a
carreira de jogador foi árbitro e técnico. Em paralelo a isso tudo trabalhou na
IBM e criou do nada a maior biblioteca particular sobre a história do Rio
Grande do Sul (a qual a PUCRS adquiriu há pouco tempo). FOI UM GRANDE HOMEM!
Meu pai é filho da segunda esposa de meu avô. Era zagueiro. No início da década de 70 jogou nos juvenis do Inter ao lado de Cedenir, Norival, Falcão e Jair, entre outros. Naquele tempo os juvenis eram a última categoria antes do profissional e era difícil subir. Meu pai atingiu a idade limite no Inter e não subiu. Falcão e Jair eram um ou dois anos mais jovens e subiram nos anos subsequentes. Antes ele havia jogado pelos juvenis do Grêmio, mas isso não vem ao caso. Citei apenas pra publicar a foto abaixo.
Atuando pelo Grêmio num grenal de juvenis |
Minha avó, depois de muitos anos, contou que um
dirigente do Inter fora à casa de meu avô dizer que gostaria de fazer contrato
profissional com meu pai, mas iria mandá-lo pegar experiência no interior
gaúcho antes de vir para se juntar ao grupo profissional do Inter, algo comum
para a época. Meu avô fez exigências impensáveis. Disse que concordava desde
que ele tivesse passe livre assim que voltasse ao Inter. Nestes termos o acordo
não aconteceu. Meu pai não ficou sabendo dessa conversa na época. Foi apenas
após a morte de meu avô que minha avó contou essa história. Meu pai fala da
boca pra fora que isso é invenção da minha avó. Talvez a experiência que meu
avô teve com o futebol e com o Inter o fizeram recusar a proposta, talvez a
preocupação com o futuro do filho. Provavelmente um pouco de cada. Talvez seja
um devaneio meu, talvez não, mas quem sabe ele não teria jogado ao lado do
Figueroa?
Se tudo isso tivesse acontecido — meu avô ídolo do Rolo e meu pai tricampeão brasileiro — provavelmente eu teria me criado dentro do Beira-Rio. Pela personalidade de meu avô desconfio que ele teria se envolvido na política do clube. Eu teria idade para participar dos grandes títulos da década passada, do tetra brasileiro de 2005 em diante. Não que eu tenha um grande futebol, mas se crescesse nesse meio talvez as coisas fossem diferentes e eu tivesse uma oportunidade — se Bolívar e Edinho podem, por que eu não poderia?
Enfim, hoje eu e meu pai somos fervorosos torcedores anônimos do Inter. Um pouco acomodados, torcedores de sofá. Aguardando um estádio com acesso fácil e confortável. Fui sócio de carteira vermelha mesmo sem o hábito de comparecer ao estádio (mas fui a todos os jogos na campanha do título da Copa Libertadores da América, em 2006 — no Beira-Rio, logicamente), mas a demissão do Falcão foi a gota d'água e cancelei o título como forma de protesto.
Mas eu não tenho dúvida que toda essa história poderia ter sido bem diferente. E há gente que acha que tem controle sobre o destino. O destino nada mais é que um desatino das probabilidades.
Gamarra Django, “El
Vingador Colorado”
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